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Pontes de Einstein-Rosen para que as quero

| Última alteração: 14/02/2022 |

Olá, que bom que você voltou! Pra lembrar, a partir da coluna anterior definimos que você deseja escrever ficção científica e/ou curte as minúcias científicas de uma ficção científica um pouco mais hard, e estamos conversando sobre como construir narrativas de ficção científica que sejam verossímeis, cientificamente embasadas e divertidas.

Nosso primeiro tema foram as viagens mais rápidas do que a luz, ou viagens MRL. Já falamos sobre o hiperespaço e minha (talvez pouco fundamentada) implicância com ele, depois passeamos até Alpha Centauri numa bolha de dobra espacial, promovida a possibilidade científica pela matemática do físico Miguel Alcubierre. Vimos que a Dobra de Alcubierre é uma interessante forma factível de viagem MRL, certamente melhor que o hiperespaço.

Agora vamos para as queridinhas de 8 entre cada 10 escritores de ficção científica (este aqui incluso, eu as uso em C7i): as Pontes de Einstein-Rosen, também apelidadas de wormholes, ou buracos de minhoca.

A não ser que você seja físico há bastante tempo, seu primeiro contato com uma Ponte de Einstein-Rosen deve ter sido igual ao do Coronel O’Neil e ao da maioria de nós, no filme Stargate. Stargate e imagens originais são © MGM.

O nome Pontes de Einstein-Rosen foi dado em homenagem à mega mente de Albert Einstein e seu colega Nathan Rosen, que redescobriram as formalidades matemáticas dessas entidades nos anos 1930. De modo independente, claro, ainda em 1916, o físico austríaco Ludwig Flamm já havia previsto os mesmos buracos de minhoca. A propósito, você talvez já saiba, mas o nome popular veio depois, como referência metafórica a um pequeno verme (minhoca) fazendo seus túneis em uma fruta (espaço-tempo) e chegando, assim, mais rápido ao outro lado desta fruta do que se percorresse toda a sua superfície.

Wormholes são figurinhas fáceis e soluções viáveis para as equações de campo da relatividade geral de Einstein, que são a infraestrutura sobre a qual os modelos matemáticos para o Universo são construídos. Recentemente o cara que mais gostava de disputar queda de braço com a genialidade de Stephen Hawking (e ganhava), o não menos genial Leonard Susskind, indicou haver, ao menos matematicamente, wormholes interligando todas as partículas que estiverem emaranhadas (o efeito fantasma do emaranhamento quântico, lembra? Ao serem emaranhadas, duas partículas vão espelhar tudo que acontecer com sua irmã emaranhada instantaneamente, mesmo se estiverem separadas por um bilhão de anos-luz).

Bazingaaaaaarrrgh…

Ocorre que, afora em Stargate e em outros filmes de ficção científica, ninguém nunca viu uma Ponte de Einstein-Rosen, direta ou indiretamente, no mundo real, só nas equações. O que quer dizer muito pouco, tanto para autoras e autores de sci-fi, quanto para físicas e físicos, sabe por quê? Porque as Pontes de Einstein-Rosen serão muuuuuuuito legais se existirem. Buracos de Minhoca poderiam nos levar de uma ponta a outra da galáxia, ou até mesmo à outras galáxias, em segundos! Esses carinhas, que vivem gritando “bazinga!” nas equações, podem até mesmo nos permitir viagens no tempo. Eita, paradoxo, vem na gente!

Ponha doses fartas de equações de campo da relatividade geral de Einstein numa coqueteleira, misture bem, derrame numa piscina de bolinhas e… bazinga! Além de um dos gênios mais engraçados da ficção, teremos também… wormholes. The Big Bang Theory e imagens são © de CBS.

Mas calma lá, nosso papo é sobre viagens MRL (se você quiser, podemos conversar sobre viagens no tempo outra hora) e vamos permanecer nelas.

Como de praxe, nem tudo são flores, e novamente precisamos de… matéria exótica (que possui pressão negativa e reage repulsivamente à gravidade) para manter esses túneis de metrô galácticos abertos, pois sua tendência natural é colapsar assim que surgem ou que são tocados por matéria comum. Matéria exótica também seria necessária para expandir os wormholes, visto que eles surgem microscópicos. Mas agora, em 2021, Jose Blázquez-Salcedo da Universidade Complutense de Madrid e seus colegas encontraram uma solução de buraco de minhoca percorrível que não requer matéria exótica, mas que ainda seriam microscópicos . Enviar por eles um sinal de rádio? Talvez. Naves e humanos? Só se forem pulverizados e “espaguetificados” antes.

Para atravessar um wormhole microscópico, uma pessoa teria que sofrer processo parecido com a “espaguetificação” que ocorre quando se mergulha em buracos negros. Toda a massa vira um longo espaguete de átomos. Ainda bem que o buraco no qual Alice caiu não era assim, senão só um monte de mágica para remontar ela no País das Maravilhas… Sobre Alice in Wonderland, animação de 1951 e imagens, que são © Disney.

No entanto, outra equipe formada por Juan Maldecena do Institute for Advanced Study nos EUA e Alexey Milekhin, de Princeton, acredita poder resolver o problema de tamanho. O modelo deles faz uso de um espaço-tempo de 5 dimensões, proposto em algumas cosmologias da teoria das cordas e que pode ter base na realidade. Maldacena e Milekhin demonstraram que uma Ponte de Einstein-Rosen amigável a seres humanos (com acelerações internas menores que 20 vezes a gravidade da Terra) pode ser real, mas esta última solução ainda contém um problema difícil: ao atravessar a nossa galáxia por uma buraco de minhoca do tipo Maldacena-Milekhin, você teria a sensação de ter levado apenas 1 segundo em sua viagem, mas para todos do lado de fora, na Terra por exemplo, se passariam milhares de anos. Você chegaria praticamente com a mesma idade ao seu destino, mas nada mais seria o mesmo no resto do Universo, milhares de anos mais velho.

Isso não chega a ser um problema, se, digamos, você está escrevendo sobre… vejamos… a história de um líder religioso ultra radical do interior empobrecido do Brasil que descobre nas terras de sua congregação um artefato que abre um wormhole do tipo acima descrito e esse sacerdote crê que aquilo são os portões abertos do céu bíblico. Depois de muita discussão teológica, o religioso decide ir ter com Deus através daquela passagem, então salta junto com os mais dedicados anciãos de seu rebanho para o outro lado da nossa galáxia em uma viagem que dura 1 segundo, e encontra lá um mundo vulcânico muito semelhante ao inferno bíblico, mas habitado por seres que vivem em paz e harmonia entre si e com o mundo deles, e que sondam outros planetas por meio de artefatos que geram wormholes. Depois de se ver obrigado a confrontar suas crenças com a realidade dos alienígenas, o sacerdote, desconcertado talvez, volta pelo buraco de minhoca que o trouxe, só para descobrir que na Terra, agora límpida de poluição e paradísiaca, muitos milhares de anos se passaram e a espécie humana está extinta, a exceção dos idosos emergindo naquele instante do buraco de minhoca. Vê? Mesmo um problema no conceito científico pode ser um bom gancho para modelar sua história.

Mas se, feito eu, em meus livros da série C7i, você também precisa que seus protagonistas viajem por Pontes de Einstein-Rosen e voltem para suas casas a tempo para o jantar, então vamos considerar que, dado o fato de que wormholes atravessam tanto espaço quanto tempo, podemos supor com um mínimo de segurança que futuros desenvolvimentos desse conhecimento possam nos proporcionar buracos de minhoca que sincronizam a saída do outro lado do túnel com a entrada do lado de cá, a ponto de não haver essa enorme discrepância entre a velocidade da viagem dentro e fora do wormhole, certo? Podemos, então, dar este problema como resolvido para nosso tipo de história.

Ponha Isso Por Escrito!

Questões narrativas práticas, vamos lá. Na prática, descrever em seu livro, ou mostrar em seu filme ou quadrinho, o mergulho de uma astronave dentro de uma Ponte de Einstein-Rosen é uma questão de óptica geométrica, mais precisamente da refração causado pela esfera lenticular que é a entrada/saída de um wormhole. Até o instante anterior ao da entrada da nave no wormhole, você a vê normalmente, mas depois passa a ver o veículo como se distorcido por lente gigantesca, o efeito é exibido de forma sensacional no filme Interstellar. Essa travessia foi muito mais próxima do que deve ser na realidade do que a do nosso querido velhinho, Stargate:

Ô, esse momento faz o coração dar aquela pausa, igual bateria de escola de samba. Orbitando a esfera lenticular que é a entrada do wormohole no filme Interstellar, a nave espacial Endurance, carregando toda a esperança de uma Terra moribunda, parece ser destruída, mas é apenas uma refração da luz que vem dela até nossos olhos (ou até a câmera que parece fixa na estrutura da própria nave). Interstellar é © Paramount Pictures.

E do ponto de vista dos tripulantes? O que se espera observar ao se mergulhar em tal distorção espaço-temporal? Ainda descrevendo sob a óptica geométrica, você despenca para dentro de uma lente que, vista de dentro, vira do avesso, veja este exemplo que é baseado no mergulho em um buraco negro, mas cujo efeito visual é semelhante e nos serve bem:

Essa imagem mostra a queda em um buraco negro que terminará com o encontro, que provavelmente será fatal, com a singularidade dentro dele. Mas se retirarmos o negrume final e imaginarmos que após olhar por sobre o próprio ombro o viajante olhe para sua frente e veja essa mesma sequência de eventos, mas no sentido contrário, então teremos uma jornada completa e um buraco de minhoca. Arte é © Redditor741.

A saída do outro lado será descrita como uma versão invertida da entrada.

Vejamos a descrição completa: em nossa ficção científica a nave estelar toca o wormhole e, para quem acompanha a jornada de fora, sua imagem se refrata como se ela estivesse sendo distorcida e estilhaçada pela imensa estrutura semelhante a uma lente. Lente através da qual se via o espaço repleto de estrelas da outra ponta da galáxia, o destino daquela espaçonave, cujos tripulantes veem a lente titânica se curvar sobre eles, como vasta boca de um deus faminto que os engole enquanto vira sobre si mesma e retoma seu aspecto lenticular, parecendo se afastar, ao passo que a nave estelar percorre a goela escura do buraco de minhoca. Os tripulantes agora olham para diante, e o que veem é outra lente, repleta de estrelas distantes, que se aproxima e se agiganta no negrume aveludado, e os engole, do mesmo modo que a primeira lente o fez, mas agora para pô-los para fora do wormhole, no extremo oposto da galáxia. A jornada não levou mais do que um segundo de suas vidas, e lhes deu uma quase infinidade de novos mundos com os quais não mais apenas sonhar, mas também para tocar, explorar e viver.

Creio que já temos material o suficiente para que você, com seu talento, leve seus personagens por redes sem fim de Pontes de Einstein-Rosen, por todo o Universo e (isso também é possível) além. Buracos de minhoca podem também, em teoria, conectar Universos diferentes.

Caramba, wormholes são uns carinhas beeeem legais mesmo.

Na próxima, e eu creio (descobertas científicas são imprevisíveis, mas estou ligadão nelas, pode deixar) última matéria sobre viagens MRL, quero conversar sobre minha última proposta cientificamente viável de fazer estes passeios. Mas desta vez vou falar sobre uma ideia que eu tive, ou ao menos eu penso que fui eu quem a teve primeiro, visto que ideias são como nuvens, passeiam por aí, sem se preocupar com fronteiras, diferenças sociais ou patentes.

I’ll be back e vida longa e próspera para Autoras e Autores nacionais de ficção científica e fantástica!

Sobre o autor: Wagner RMS.

Espalhe nosso amor pela nossa literatura:

2 comentários em “Pontes de Einstein-Rosen para que as quero”

  1. Legal… Em teoria e ficção, sempre funciona. Mas na vida real, tenho minhas dúvidas se isso será possível. Pondero a respeito da energia necessária para abrir um buraco de minhoca… Será que um dia conseguiremos dispor de tanta energia assim?

    Outra coisa: quando o C7i se tornará C8i? Ou parou no sete mesmo?

    Abraços!

    1. Caro Pedroom Lanne, agradecemos por seu comentário, muito pertinente ao artigo, realmente certas coisa são imprevisíveis. A ciência é uma delas, só a gente lembrar que a previsão era que celulares continuassem diminuindo até caber dentro da orelha e hoje pagamos bem caro por telas cada vez maiores, kkkkk. Pode ser que nunca tenhamos a energia e o tipo de energia necessária para abrir e manter estável uma ponte de Einstein-Rosen, pode ser que descobertas geniais mostrem que nenhuma energia exótica ou em quantidade absurda é necessária, pode ser que, assim como acontece no C7i do Wagner RMS, a humanidade consiga minerar a energia do vácuo e aí ela seja praticamente infinita, ou pode ser que a humanidade, com suas mazelas e rancores, se autodestrua bem antes de chegar às estrelas. Torcemos pelo melhor.

      A saga space opera que o Wagner desenvolve é bem legal, não é? Ficamos ansiosos pelo próximo volume da série. Mestre Wagner avisa que, na medida do possível, apesar de pandemia e outros problemas que ele tem enfrentado que impactam em sua escrita, ele está escrevendo os próximos episódios da série o mais depressa possível e agradece muito seu interesse.

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